Count Vronsky: I love you!
Anna Karenina: Why?
Count Vronsky: You can't ask Why about love!
Anna Karenina: Why?
Count Vronsky: You can't ask Why about love!
Ontem, pelas 14.30, eu ia ver «Anna Karenina», em
estreia nacional. Ia, mas avisaram-me logo que talvez não fosse possível,
porque ainda não tinham experimentado a fita na máquina e tal. Mas, quase vinte
minutos depois, deu (cortaram depois o intervalo, para compensar). E uma senhora
que ia ver o «Amanhecer» acabou por vir também - não se deve ter arrependido,
seguramente. Isto porque o filme é uma experiência artística difícil de
definir, melhor, difícil de igualar.
Quando temos muitas expectativas sobre alguma
coisa, é costume ficarmos desiludidos. Aqui eram muitas. Primeiro porque era de um dos
meus realizadores favoritos, que já nos deu outros dois (pelo menos) grandes
filmes que fazem parte da minha lista de favoritos: «Pride and Prejudice» e «Atonement»,
depois porque tem Keira Knightley (Anna) , a mesma que protagonizou os dois
filmes acima referidos, com Jude Law (Karenin) a acompanhar (de quem gosto
muito desde que o vi nos filmes de Anthony Minghella - «Breaking and Entering» e
«Cold Mountain») e Matthew Macfadyen (Oblonsky), que já fora o amor da vida da
personagem de Keira em «Pride and Prejudice» e agora passa a ser o irmão, entre
outros atores interessantes. Mais ainda porque a banda sonora está a cargo de
Dario Marianelli que, pasme-se, já tinha feito as dos dois anteriores filmes
também (e a de «Atonement» é das criações mais fantásticas de sempre para
filmes e não só). Caso para dizer que em equipa vencedora não se mexe. E, como
se compreendeu já e se verá a seguir, não fiquei nada desiludido.
Por fim, a adaptação de um dos grandes romances
da humanidade, de Tolstoi, que li já há alguns anos, mas que conservo na
memória: pelo fascínio de Oblonsky, pela busca de uma dignidade por parte de
Levin, pelo amor e pelo sofrimento de Anna. Tinha visto este ano uma adaptação
boa do romance, num filme de 1997 com Sophie Marceau e Sean Bean. Mas achei-a
um pouco rápida, por vezes superficial, embora os protagonistas estivessem
ótimos. Neste não há um Sean Bean - que agora já só poderia ser um Karenin -
mas um Aaron Taylor-Johnson que está bem no que tem de fazer.
É talvez este tom de tragédia que estará na opção
de uma filmagem diferente. Lars Von Trier, há uns anos, apostou fazer
«Dogville» num palco, em que as casas estivessem desenhadas no chão, quase sem
adereços mais. Aqui, os adereços são aos milhares, claro, mas quase tudo foi
feito também numa sala de teatro. Não se espantem, portanto, por verem cortinas,
cadeiras, palco, bastidores – aqui vivem sobretudo os do povo, os que vivem
numa Rússia à beira da revolução e não sabem o que ela é, o que ela promete, e
quando sabem nem sabem se a querem. Teatro, portanto, pois a vida é teatro, já
se sabe também há muito. Para que não se esqueça tudo aquilo que anda em torno
da história. E se tudo se passa naquele sítio, temos painéis que se levantam,
portas que se abrem ou se fecham, personagens que passam de um sítio a outro,
tudo de uma forma mágica e económica da narrativa, criando uma fluidez inédita,
que o teatro tem explorado e que o filme também faz. Tragédia para quem está
preso naquele mundo sugerido pelo teatro, mas liberdade para Levin, a única
personagem que inicialmente anda pelas paisagens exteriores, pelo mundo real,
para onde leva Kitty…
Nada a dizer do elenco, a não ser que é muito
bom. Muito se disse sobre Keira não poder ser uma boa Anna Karenina. Sim, ela
não é boa, é perfeita e as nomeações para prémios já surgiram. Jude Law, que
poderia ter sido Vronsky há uns anos, está ótimo na sua contenção, na sua
«santidade». Não referi ainda, mas faço-o agora: Domhnall Gleeson é um Levin
perfeito, assim como muito bem estão Kelly Macdonald, Emily Watson, Michelle
Dockery, além de Matthew Macfadyen e Aaron Taylor-Johnson, já referidos.
Fidelíssimo ao livro, a história está toda ela no
filme. Toda ela, de uma forma ou outra, sem rapidez no essencial, no que em
muitos filmes me leva a perguntar «de onde vem tanto amor?». Aqui há a
perseguição, o desespero, a culpa por não ter feito nada ainda, o desespero, a
entrega. E tudo o que isso provocará. Há os boatos, o falar dos outros (que bem
feitas estas cenas, com as personagens paradas, extáticas, ou só com o som de
palavras sussurradas, que não se entendem, até subirem de tom e se tornarem
acusadoras), que contrasta com o silêncio do jogo de cubos onde Levin e Kitty
finalmente se entendem.
Poder-se-á ler por aí críticas de senhores
(supostamente) entendidos em cinema. Um dos que li classifica o filme como
«razoável». Quem é crítico de cinema tem uma certa tendência para escrever
coisas muito más sobre os filmes, muitas vezes só destaca pela positiva filmes
enfadonhos, mesmo, de muita política, de senhores cujo nome não pode ser
tocado. Está-lhes no sangue, ou na carteira, não sei. Dizer que este filme é
razoável é, no mínimo, dizer incompetente o crítico que o afirmou. O
«síndrome-souflé» é outra expressão usada noutro sítio, como se os críticos
tivessem de escrever com conceitos modernos e bonitos para chamar a atenção de
leitores… esperem, têm mesmo! Porque, meus senhores, mesmo que não sintam as
angústias das personagens, profundamente marcadas, profundamente vividas, ao
menos a criação estética está. E estar isto, pelo menos, é mais, muito mais do
que muitos filmes que por aí andam conseguem. Não se chora neste filme pela
história em si, ou não só. Há lágrimas de alegria e de tristeza. Eu atrevo-me a
dizer que há também lágrimas de beleza. De infinita beleza. O realizador está
na posse de uma visão artística inigualável, talvez aqui extremada em
virtuosismo, quase a raiar a loucura. Mas não está a própria Anna a raiar a
loucura quando a sociedade machista e fechada em que vive desaprova o seu amor?
Não sei se transmiti bem o que queria. No final
do filme, atordoado, o funcionário do cinema perguntou-me se o filme era bom.
Mas percebeu logo que sim, ao ver a minha expressão e os olhos húmidos. Não se
enganem, é. Mas o melhor é verem e ajuizarem. A ideia disto tudo é simples: um
belo sucessor de «Atonement», também ele adaptado de um romance e o meu de
eleição, com uma história extraordinária, complexa, múltipla, abarcada de uma
forma singular e que vale a pena ver, em tela grande!
2 comentários:
Боже мой! O que é que eu faço, pois aqui ainda falta um século para a estreia (10 de fevereiro)?!
a sério? não é possível!
bem, eu fui ver no cinema mesmo, ainda não existem outras formas de o ver :(
as minhas simpatias...
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