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Alguns enxames de abelhas invadiram o Museu do Louvre e exploraram cuidadosamente todas as naturezas mortas com flores, não tendo deixado um único grão de pólen.
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Era quase tão bela como a Vénus de Milo. Um dia cortou os braços a sangue frio.
Era quase tão bela como a Vénus de Milo. Um dia cortou os braços a sangue frio.
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Na tarde em que ia morrer estava Sócrates com os seus discípulos quando um pássaro com um ramo de ervas no bico irrompeu na cela. Depois de ter bebido a cicuta, Sócrates continuou discorrendo durante algum tempo ainda, sobre a imponderabilidade do pensamento. Morreu com um sorriso na boca. Os discípulos repartiram entre si os objectos de uso pessoal. O pássaro que até aí se mantivera na penumbra apoderou-se do sorriso e desapareceu no céu de Atenas.
Na tarde em que ia morrer estava Sócrates com os seus discípulos quando um pássaro com um ramo de ervas no bico irrompeu na cela. Depois de ter bebido a cicuta, Sócrates continuou discorrendo durante algum tempo ainda, sobre a imponderabilidade do pensamento. Morreu com um sorriso na boca. Os discípulos repartiram entre si os objectos de uso pessoal. O pássaro que até aí se mantivera na penumbra apoderou-se do sorriso e desapareceu no céu de Atenas.
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Cabril
Esta noite sonhei que era um rio. Um rio pequenino, é certo, que nada mais conhecia além das montanhas onde nascia, dos amieiros e dos juncos que nele se debruçavam. Como todos os rios, o que eu mais ardentemente desejava era desaguar. Comecei a perguntar onde ficava o mar, mas ninguém me sabia responder. Apontavam-me com um gesto vago ora o este ora o oeste. Escolhera já a forma de desaguar – em delta, claro – mas não recolhera ainda o menor indício da proximidade do mar. Uma noite em que estava acampado ente as dunas cheguei finalmente a uma conclusão (a mesma a que todos os rios chegaram talvez antes de mim): o mar não existia.
(E essa conclusão era salgada.)
Cabril
Esta noite sonhei que era um rio. Um rio pequenino, é certo, que nada mais conhecia além das montanhas onde nascia, dos amieiros e dos juncos que nele se debruçavam. Como todos os rios, o que eu mais ardentemente desejava era desaguar. Comecei a perguntar onde ficava o mar, mas ninguém me sabia responder. Apontavam-me com um gesto vago ora o este ora o oeste. Escolhera já a forma de desaguar – em delta, claro – mas não recolhera ainda o menor indício da proximidade do mar. Uma noite em que estava acampado ente as dunas cheguei finalmente a uma conclusão (a mesma a que todos os rios chegaram talvez antes de mim): o mar não existia.
(E essa conclusão era salgada.)
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A borboleta que poisou
no teu mamilo perdeu
a vontade de voar
A borboleta que poisou
no teu mamilo perdeu
a vontade de voar
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Vou ao céu
E venho-
-me
Vou ao céu
E venho-
-me
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Qual é a minha
ou a tua
língua?
Qual é a minha
ou a tua
língua?
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O Velho Poeta
O seu desejo era que plantassem
um espinheiro numa nesga de
terra frente ao mar e ao rio
e que ele florisse nem
que fosse uma única vez
Este espinheiro protegê-lo-ia
mais do frio que um edredão
A nesga de terra continua lá
e o mar e o rio e a manhã
Só o espinheiro e o poeta
é que não
O Velho Poeta
O seu desejo era que plantassem
um espinheiro numa nesga de
terra frente ao mar e ao rio
e que ele florisse nem
que fosse uma única vez
Este espinheiro protegê-lo-ia
mais do frio que um edredão
A nesga de terra continua lá
e o mar e o rio e a manhã
Só o espinheiro e o poeta
é que não
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A Religião da Cor
A paleta está cheia de cores: azul-celeste, laranja, rosa, cinábrio, amarelo vivo, violeta, borra de vinho.
Falta-me uma cor ainda. Para pintar a inexistência de Deus.
A Religião da Cor
A paleta está cheia de cores: azul-celeste, laranja, rosa, cinábrio, amarelo vivo, violeta, borra de vinho.
Falta-me uma cor ainda. Para pintar a inexistência de Deus.
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Van Gogh por ele próprio
Vivo numa cela. O universo é uma cela com três metros de comprimento por dois de largura. Fecharam-se nesta cela e disseram-me: Bem, Vincent, agora podes correr à vontade.
Van Gogh por ele próprio
Vivo numa cela. O universo é uma cela com três metros de comprimento por dois de largura. Fecharam-se nesta cela e disseram-me: Bem, Vincent, agora podes correr à vontade.
Jorge Sousa Braga, O Poeta Nu, Assírio & Alvim, p.30, 36, 37, 99, 178, 179, 184, 277, 296, 299.
5 comentários:
Que dizer a cada um dos amigos que me disseram: gosto de ti - vem e fica??
Deixo este testemunho: esta luz forte e sublime.
OBRIGADO!
muito obrigado*
quer dizer que voltaste? que bom! vou poder continuar a descobrir mais da poesia - dos outros e tua! Quem bom!
abraço
só para dizer que gosto muito da poesia do jorge sousa braga.e sim. tenho de trabalhar , por isso aqui. beijo
oh.. porque apareceu assim? eu sou mim.
:(
lol, serás sempre a mim... fica-te tão bem! e depois, Marta já tenho uma outra, também especial, no colégio. Mas serás sempre a mim, a das coisas todas. e jorge sousa braga é muito bom. e não me fales em trabalho, que me apetece atirar-me da janela! boa sorte com a comunicação ;)
bjs
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