sexta-feira, junho 26, 2009

desafio em junho


Vieira da Silva, mais uma Bibliotèque


Continua o desafio, em fase de abrandamento, pois a dissertação tem de estar feita no próximo mês, e quatro artigos me aguardam... De Luísa Dacosta, agora descoberta e ainda à espera que leia os outros livros que tenho (edições muito bonitas da Asa), ao meu já muito conhecido (e genial) Saramago, passando pelo inevitável (depois do filme) O Leitor, poesia (a do Eugénio, finalmente, mas que confirmou a minha não muita adesão ao seu mundo) e contos e micro-narrativas (Augusto Monterroso é muito bom) e até literatura infantil.



56. A Maresia e o Sargaço dos Dias, Luísa Dacosta, Asa, 78p.*****
57. Luísa Dacosta - entre Sílabas de Luz, Asa, 78p.****
58. Natal com Aleluia, Luísa Dacosta, Asa, 78p.*****
59. O Leitor, Bernhard Schlink, Asa, 144p.*****
60. A Jangada de Pedra, José Saramago, Caminho, 350p.*****
61. À noite as estrelas descem do céu, João Pedro Mésseder, Campo das Letras, 60p.****
62. Versões - Mundos (d)escritos em Português, vários autores, CIC - Portugal/autonomia 27, 166p.***
63. A Ovelha Negra e outras fábulas, Augusto Monterroso, Angelus Novus, 120p.*****
64. «Ficções 9», direcção Luísa Costa Gomes, Tinta Permanente, 148p.***
65. Uma Aventura na Amazónia, Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada, Caminho, 240p.***(*)
66. O menino que não gostava de ler, Susanna Tamaro, Presença, 40p.****
67. Poesia, Eugénio de Andrade, Fundação Eugénio de Andrade, 660p.****(*)


Filmes:
You don't mess with Zohan*** (pelo ridículo, pelo Adam Sandler, pela Mariah Carey...)
RocknRolla**** (pelo déjà vu - pessoal - não total...)
Sobreviventes***(*)
Happy Feet****(*)

segunda-feira, junho 22, 2009

III. 19. Conto levemente erótico


Olharem-se era apenas o início, pois o olhar ensinava-os sobre as mãos e sobre a pele. E as mãos ensinavam-nos a ver melhor. E depois do olhar, as bocas percorriam-se com uma falta de algo que só os corpos pudessem mitigar. As mãos procuravam-se, exactas de tempo, exactas na procura do improviso, no imprevisto dos corpos reagentes. Procuravam-se e encontravam-se nas planícies, nas florestas. Perdiam-se e achavam-se, cheias, para novamente se perderem e, cheias de saudade, voltarem a encontrar-se. E depois das mãos e das bocas, todo o restante corpo, um contra o outro, explorando-se na pele, nos pêlos, no sangue latejante, como se o tempo não chegasse, como se a vida pudesse ser sempre aquilo, como se as coisas se reduzissem a ambos tornados unos, perdidos nas palavras sussurradas, gemidas, balbuciadas, até os corpos se soltarem novamente e apenas se abraçarem, enquanto entram num outro mundo, sem consciência.
Acordar-se era tarefa do sol na janela ou do despertador. E era nascer para a consciência da individualidade e da solidão. A cama estava desfeita, ele talvez um pouco molhado ainda, mas só. Porque nada do que se passava era real, apenas fruto do desejo presente e das memórias do passado – viventes ambas nesses tempos, funcionantes de modo imperfeito no presente, mas sem esperança de projecção no futuro. E era certo que depois, no banho, haveria de chorar, mas só no banho, para que as lágrimas não se notassem, nem para ele. E que, em outras noites, olhar-se era apenas o início, pois o olhar ensinava-o sobre a mão e sobre a pele e a mão ensinava-o a ver melhor. E depois do olhar a boca ficava expectante do momento em que tivesse de soltar-se em prazer. Sem tempo, sem espaço de vida a mitigar, a inexactidão do mecânico, ainda assim cheio de saudades da pele, dos pêlos, do sangue latejante, do tempo em que a vida podia ser apenas aquilo, as coisas fossem unas de ambos, em que as palavras tinham o poder de trazer um ao outro em segundos de ser.
Até ao dia em que desaprendesse de amar: os olhos recusassem a ver, as mãos a descobrir, a pele a sentir, as palavras a criar. Ou talvez não fosse ainda tarde nesse dia, se os sonhos e a solidão pudessem funcionar como reservatório de emoções. E um dia, ao acordar com o sol a dourar-lhe o corpo extenuado, talvez não precisasse de chorar, pois teria aprendido alguma coisa que o levaria a ser diferente, mesmo sendo o mesmo.

Deolinda, enfim!

Já aqui falei dos Deolinda, por diversas vezes. E aqui em específico contei a primeira das oito tentativas de ver os Deolinda ao vivo. A primeira foi em Vila Real, a segunda foi em Braga (FNAC), mas estava com uma otite, novamente em Braga (Teatro-Circo) não consegui bilhete, tal como não conseguiram para mim em Vila do Conde. Depois foram a Barcelos, e o convite meio estranho e em cima da hora foi posto de parte por vontade alheia, de que dependia, mas a verdade é que não me apetecia muito vê-los por lá. As queimas: Porto (no dia seguinte tinha aulas ou coisa parecida), Bragança (idem, longe), Braga (a companhia/boleia sentiu-se mal, já não deu). A Sandra viu em São João da Madeira e, não conhecendo muito, gostou muito. A minha irmã e o meu primo Marcelo nem chegaram a ver, de tão tarde chegaram ao Queimódramo. A minha prima Rita delirou em Bragança. Mas chegou o dia. Em Vila do Conde, ao ar livre. Muito bom, com a Milai e companhia, e também com a Filipa e o marido. Valeu a pena a espera - e não terá sido o último... O concerto foi muito bom, com todas as músicas, duas novas e uma da Amália. Grande presença em palco da Ana Bacalhau, a cantar as músicas quase sempre introduzidas por uma pequena história, onde «há sempre um problema». E não deixo nenhuma música - há muitas no disco e no youtube...

quarta-feira, junho 10, 2009

Dois poemas de Luísa Dacosta

Entretenimento

Como quem procura conchas à beira do mar,
escolho as palavras para te dizer,
quando o silêncio dos teus braços
vestir o frio dos meus ombros.


Apelo

Atravessa os campos da noite
e vem.

A minha pele
ainda cálida de sol
te será margem.

Nas fontes, vivas,
do meu corpo
saciarás a tua sede.

Os ramos dos meus braços
serão sombra rumorejante
ao teu sono, exausto.

Atravessa os campos da noite
e vem.


A Maresia e o Sargaço dos Dias, Porto: Edições Asa, 2002

dois poemas de Saúl Dias

Lidos no mês passado, e a fazer antevisão do futuro. Além dos dois poemas, dois outros versos.
«Eras uma flor inventada
com milhões de sóis em cada pétala.»

1.
Havia
na minha rua
uma árvore triste.

Quebrou-a o vento.

Ficou tombada,
dias e dias,
sem um lamento.

(Assim fiquei quando partiste...)

2.
Sofro
de não te ver,
de perder
os teus gestos
leves, lestos,
a tua fala
que o sorriso embala,
a tua alma
límpida, tão calma...

Sofro
de te perder.
durante dias que parecem meses,
durante meses que parecem anos...

Quem vem regar o meu jardim de enganos,
tratar das árvores de tenrinhos ramos?

Tarde Azul, poemas de amor de Saúl dias e desenhos de Julio, Lisboa: Bonecos Rebeldes, 2008.
(edição muito bonita, sobretudo pelos desenhos)

terça-feira, junho 09, 2009

Adeus (+ poema, só porque sim)


Entre nós não há apertos de mão. Isso é para os outros. Ou só nos dias de cerimónia: aniversários, primeiras saudações formais, despedidas e regressos para/de férias. E agora não será diferente, apesar das quebras. Estenderemos as mãos e as palavras serão as mesmas, puídas, gastas, apesar do pouco uso entre nós. Ainda não sei se para sempre, se apenas até Setembro, dir-nos-emos adeus. Não como o do poema, embora tu desses um poema que nunca escrevi e que nunca te daria num cartão. Entre nós não há mãos que cheguem - o artifício não me cai. Não esquecerei o momento breve em que tas guardei nas minhas, só para vermos temperaturas. E quem diz mãos diz olhos, risos, palavras. Chega o momento do adeus a passos largos - adeus simbólico, porque já o dissemos há muito. E pois que terminamos. O que se diz a quem se ama sem se poder falar do amor por proibição?


09-06-09


*****

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.

Eugénio de Andrade, Poesia

terça-feira, junho 02, 2009

Forma Breve 6

Acabo de receber o meu exemplar da revista. E uma carrada de separatas. O meu artigo é pequeno, fofinho, sobre o Mia. Um trabalho de seminário do mestrado para o professor Alberto Carvalho. Pode ler-se lá: «"O Embondeiro que sonhava pássaros", de Mia Couto: descrição de uma poeticidade». Não é o meu primeiro artigo divulgado (a minha carreira longa e extensa inclui congressos, colóquios e artigos on-line - sim, claro, pode ver-se a lista ao lado), mas é o primeiro impresso, para já, e isso faz a diferença.