segunda-feira, março 31, 2008

Sugestões de Março


Nem sempre muito actualizadas, é certo. Mas o tempo é aquela coisa escorregadia que me escapa entre os dedos, sobretudo quando o deixo fugir porque me empreguiço. E para quem tem mais facilidades de livrarias, cabo, aluguer de filmes e assim as susgestões podem parecer muito atrasadas... Aceitam-se também outras sugestões.


Livros:

1 – A Bíblia (Jeremias, Lamentações, Baruc), Paulus

argumentos: Em Jeremias vi sobretudo o profeta em que não se acredita e sofre nas mãos dos incrédulos, e se tem vontade que as suas palavras ditadas por Deus aconteçam o mais rápido possível (já que não há duvida de que acontecerão). Lamentações é um conjunto de cantos fúnebres sobre a destruição de Jerusalém e vale por alguns versos como: «Vós todos que passais pelo caminho, olhai e vede:/ haverá dor semelhante à minha dor?» Lm 1, 12-13. Baruc, em prosa e verso, dá-nos uma ideia do sentimento de exílio dos israelitas espalhados pelo mundo. Insistência na visão horrível das pessoas que chegam «ao ponto de comer a carne de seus próprios filhos e filhas» Br 2, 3.***


2 – Palomar, Italo Calvino, Planeta DeAgostini

argumentos: o nome Italo Calvino deveria chegar, mas está bem: é um livro pequeno feito de pensamentos, observações, experiências de um peculiar Palomar que nos vai dando conta do seu modo de ver e estar no mundo, através da descrição, narração e meditação. Reflexões muito interessantes sobre o silêncio que usarei na minha dissertação. E ainda: «estar morto, significa habituar-se à desilusão de se sentir igual a si próprio, num estado definitivo que já não pode esperar modificar.»p.127****


3 – Os Achados da Noite, José Jorge Letria, Prémio Cidade de Ourense

argumentos: poesia precisa-se mas eu não sei recomendar livros de poesia… Muito menos quando são individuais (e não antologias ou a compilação da obra completa…). Por isso ficam aqui só alguns versos de que gostei: «A minha idade é a de todos os medos»p.15; «Não ouso sair/ de onde estou e estou tão só que não suporto/ o eco grave de uma voz sobreposta à minha voz»p.93***


4 – Poemas Completos, Manuel da Fonseca, Portugália

argumentos: obra que documenta, poesia com personagens, o Alentejo, insatisfação, ansiedade, vida, raiva contra o mundo… expressões que só fazem sentido lendo a sua poesia. «vinham as naus no silêncio das coisas mortas./ Os homens tinham esquecido as palavras de navegar»p.19; «Ao menos se alguém morresse/ e esse alguém fosse um de nós/ e esse um de nós fosse eu…»p.103; « - em que dia nos vamos suicidar?»p.138.***


5 – O Estrangeiro, Albert Camus, Público/Mil Folhas

argumentos: finalmente chegou a vez de Camus. E comecei logo por um que adorei. Fiquei conquistado por Mersault e sua maneira de estar no mundo e se relacionar com os outros, indiferente, indolente, apático. E a sensação de revolta pela incompreensão deste ser demonstrada em tribunal, onde tudo é deturpado, ou não fizesse ele parte do ciclo temático do absurdo. Excelente texto para se estudar as relações Literatura-Direito. «Eis aqui a imagem deste processo: tudo é verdade e nada é verdade»p.73.*****


6 – A Peste, Albert Camus, Diário de Notícias

argumentos: e continua a leitura de Camus. E mais um grande livro, desta vez do ciclo temático da rebelião. Uma cidade assomada pela epidemia da peste e as reacções das diversas personagens à situação de perigo, isolamento e distância dos entes queridos, em que a condição humana é posta à prova. Lido como uma alegoria em relação à ocupação alemã, pode ser lido muito para além disso. Mais: «sem memória e sem esperança, instalavam-se no presente. A peste, é preciso dizê-lo, tirara a todos o poder do amor, e até o da amizade. Porque o amor exige um pouco do futuro e, para nós, já não havia senão instantes.»p.132; «Nada no mundo vale que nos afastemos daquilo que amamos. E, contudo, também eu me afasto, sem que possa saber porquê.»p.152; «há nos homens mais coisas a admirar que coisas a desprezar.»p.222.*****


7 – A Queda, Albert Camus, Livros do Brasil

argumentos: deste não gostei tanto, mas ainda assim é muito bom. Pertence ao ciclo temático da medida (estes ciclos foi o próprio autor que assim os designou). Um discurso de um homem do Direito para um interlocutor também ele desse mundo. Muitas reflexões sobre a vida e sua condição. Mais: «nós não estamos senão mais ou menos em todas as coisas»p.11; «muita gente trepa agora à cruz somente para que a vejam de mais longe, mesmo se para isso for preciso espezinhar um pouco aquele que lá se encontra há tanto tempo»p.134.****


8 – Pensamentos, Marco Aurélio, Livros RTP

argumentos: uma colecção de pensamentos, alguns em estilo aforístico, a partir dos melhores exemplos gregos próximos de uma filosofia estoicista ou da sua experiência de homem dobrado ao íntimo, em torno da morte, da brevidade da vida, da fugacidade dos prazeres e da fama, da mudança. Mais: a morte «não é somente uma obra da natureza, é uma obra útil à natureza»p.22 e «Tens uma excelente maneira de te defenderes deles: evita ser-lhes semelhante.»p.64.***


9 – O Outro Que Era Eu, Ruben A., Assírio & Alvim

argumentos: pronto, outro livro e outro escritor que me fica para recuperar um dia. A extraordinária história de um homem que é dois – não mentalmente – mas sim fisicamente, desdobrado, em que um faz tudo o que o outro não consegue fazer: «indivíduo sai de si continuando a ser ele próprio, e se forma em outro que é ele próprio»p.71. E as reacções do país que não consegue perceber (país nacionalista que se pode ver no tempo da ditadura) o alcance da sua natureza. Mais: «ainda existiam escondidas, pessoas capazes de dizer que não. A tragédia é que se desconhecia onde habitavam.»p.47 e «Eu devia matar-me por acidente!»p.79.*****


TV:

Anatomia de Grey

argumentos: uma das minhas séries favoritas já há algum tempo. Por tudo, pelas histórias (se bem que o caso amoroso Meredith e McBrasa podia resolver-se sem tanto enredo…). Começou na RTP1, dava fim-de-semana sim, fim-de-semana não ou mais ou menos. E eu achava estúpida, porque não gostava de séries de hospitais (excepção para o Dr House, de que já gostei mais…). Depois passou para a noite, às tantas, dois episódios seguidos – e eu vi tudo… tipo tolinho. Repetiram na Dois: e eu voltei a ver quase tudo. E agora aproxima-se do fim e espera-se a nova série com novos desenvolvimentos. Sim, eu não tenho cabo ou coisas do género mas vou sabendo umas coisas pela net... Só espero que não desapareça como O Amor no Alasca.
Mas há outras recomendáveis: Dexter é estranha, um pouco chata por causa dos pensamentos infinitos que preenchem a cabeça do protagonista e dos ritmos latinos à Miami que se vão ouvindo, mas tem cenas interessantes. Irmãos e Irmãs é também de se lhe tirar o chapéu, mas já vai muito adiantada e não se perceberão alguns dos antecedentes que influenciam a história de agora se não se viu do início… Mas vale a pena, e com grande elenco. A Dois: continua a ser a melhor alternativa da tv portuguesa. E as Noites da Dois: brindaram-nos esta semana com duas mini-séries extraordinárias: A Linha da Beleza (do romance homónimo de Alan Hollinghurst, de Saul Dibb, com Dan Stevens, Alex Wyndham , Oliver Coleman, Hayley Atwell, Don Gilet), e Elizabeth I ( de Tom Hooper, com Helen Mirren e Jeremy Irons). Recomendo – estejam atentos que elas voltam qualquer dia (acho que até já deram antes, eu é que na altura tinha vida…).


Música:

Ana Moura – Para Além da Saudade

argumentos: conhecia esta grande fadista de uns fados escolhidos para estarem na colecção de fado do Público: Porque Teimas Nesta Dor e Nasci Para Ser Ignorante. E já tinha ouvido também O que foi que aconteceu, algures no pc (agora resgatada). Depois ouvi-a numa novela da TVI com O Fado da Procura – e ficou na cabeça e adoro-o. Daí a ter o último cd ainda demorou, mas já o tenho e ouço-o muito, agora. Os Búzios, Águas do Sul, O Fado da Procura, Rosa Cor de Rosa, Mapa do Coração, Aguarda-te ao chegar, Até ao fim do fim, Fado das Horas Incertas, Vaga no Azul Amplo Solta (há mais vídeos no youtube de outras músicas) são os meus fados favoritos de um conjunto de quinze grandes canções… Voz quente, grave mas bonita. E com muito bom gosto.

Palavra ainda sobre o Festival da Canção. Parece-me que a escolhida tem algum potencial, a Vânia é potente. A minha canção favorita não ganhou; Magicantasticamente!, dos BláBláBlá, aqui.


Cinema:

O Labirinto do Fauno

argumentos: de Guilherme del Toro com Adriana Gil, Ivana Baquero e Sergi López. Um filme de 2006 que ganhou três Óscares: direcção artística, fotografia e caracterização – quem o viu ou ver percebe porquê. História de uma menina com uma mãe grávida e doente e de uma figura paternal comandante de uma das facções da guerra civil espanhola que encontra um mundo alternativo e do qual é a princesa. Para poder voltar à sua origem tem de cumprir três perigosas tarefas (e numa delas encolhemo-nos todos porque sabemos que a criatura sem olhos e quase mumificada que preside ao festim vai acordar e persegui-la… E pronto, mais não conto, porque vale a pena a ver. E tem um labirinto também.****


Os Irmãos Grimm

argumentos: de Terry Gilliam, com Matt Damon, Heath Ledger, Mónica Belluci, Jonathan Prye e Lena Headey. Uma história alternativa da vida dos dois irmãos alemães que vivem a vida a encenar fenómenos paranormais até ao momento em que descobrem um verdadeiro e tem de lidar com o cepticismo de um e a crença do outro (baseado no seu livro de histórias – que vão surgindo em determinados elementos e objectos). É giro para ver com amigos, sobretudo se perceberem alguma coisa das histórias…***

quinta-feira, março 20, 2008

EILC2


Tanto tempo depois, o relato prometido. O EILC2 foi em Janeiro e Fevereiro deste ano. Comecei o ano a trabalhar, numa coisa relativamente fácil e de que gosto (já em Agosto gostei). Não foi tão trabalhoso e intenso este, mas foi-o nas relações e contactos. Novos amigos, menos desta vez (só eram 30 erasmus), mas mais dos velhos amigos - e estive com muitos, desta vez. Desde a Marta e a Patrícia (um único fim de tarde no Lais), à presente constante da Su (seus stresses habituais, agora por causa da área de projecto - tema do trabalho de mestrado, e de outras coisas decorrentes das aulas que vai dando) nas últimas quatro das cinco semanas em que estive na casa da Ana, minha amiguinha que me acolheu tão bem na sua belíssima casa (e não esqueçámos a sua simpática e bonita irmã), passando pela tarde com as Anas: Luísa e Verde, pelos jantares em que surgiram a Su ;), a Lena, a Mitó e a mãe da Su, a D.ª Manuela, e o último fim-de-semana na casa da Consti e seus muitos gatos, e o primeiro a ajudar a Joana Patrícia em Literatura Medieval, a Marisa e o Herberto no metro, a Bruna numa fase complicada... e todos os outros com que me fui cruzando. E voltei a estar com pessoal da Reitoria - gosto muito da Eugénia, claro. E estive novamente com as minhas queridas formadoras do curso (bem, a Débora só apareceu no primeiro dia, desapareceu para Israel), fiquei só, com a Ana Isabel e a Ana Paula. E conheci nova guia, a Susana Barros.


Adormeci no metro muitas vezes (abusava nas horas de deitar, às vezes...). Mas consegui ler muito. Muitas conversas, planos, coisas que ninguém percebe além de nós - talvez a Mitó, que nos ia seguindo à distância do msn - Sala de chuto, SuBubu Fetuttini (que dorme com o peixe víbora), AnaPanda, TiMika (tudo junto para passar despercebido)... Armei-me em Paula Moura Pinheiro a apresentar o debate sobre adopção para as meninas da Fracinetti - os risos, os enganos, as câmaras que paravam - e ganhei chocolates! Elas a trabalhar, eu a fingir que fazia o meu artigo para o colóquio de Fevereiro, mas na verdade todos fizemos o que tínhamos a fazer e bem, enquanto íamos conversando, imagine-se, pelo msn quando estávamos todos na mesma sala, às vezes os três na mesma mesa... e depois ríamo-nos como uns tolinhos...



Umas idas aos saldos, claro. E FNAC, alfarrabistas e Feira do Livro do Mercado Ferreira Borges (foto acima), gastar o que ainda não tinha recebido. Muitos passeios pelo Porto - com o pessoal ou sozinho. Visitámos o centro histórico, a Sé, os Clérigos, a Freguesia da Vitória, Palácio da Bolsa, Caves, Riberia, Igreja de São Francisco e suas catacumbas, Igreja de São João Novo, Igreja dos Grilos... E os passeios por Braga (centro histórico, Sé Catedral, Museu de Arte Sacra e Bom Jesus) e Guimarães (centro histórico, Paço dos Duques, Castelo, Igreja de São Miguel - e as figurinhas tristes do pessoal a descer a torre de menagem)... E uma festa final com a Tuna Feminina da FLUP, entrega dos diplomas e lancharada...

Guimarães: Vista da Torre de Menagem do Castelo: Igreja de São Miguel e Paço dos Duques


Braga: os erasmus, no único dia de visita chuvoso, no Bom Jesus

Os erasmus: gostei mais dos de Agosto, no geral. Mais dados, mais aplicados. Mas também eram mais, o clima era outro e a faculdade era só para nós... Mas ficam a Dalida, o Christian, a Suzana, a Marta, a Maria, a Virág, o Viktor, o Balázs, a Sara, a Katarzyna... Depois a paixão. Devagar, devagarinho. Até me aperceber que sim, que era. E seus desenvolvimentos inesperados...
E pronto, muito pónei o texto, eu sei. Às vezes irrita-me escrever... E hoje estou irritado para escrever... Ficam algumas fotos muito relesmente tiradas com o tlm a ilustrar...



P.S. - começou hoje a Primavera, pelo menos no calendário... E as fotos que não têm legenda são do Porto, claro...

terça-feira, março 18, 2008

Anthony Minghella 1954-2008

Anthony Minghella realizou dois dos meus filmes favoritos: O Paciente Inglês (1996) e Cold Mountain (2003).


Minghella venceu em 1997 um Óscar de melhor realizador pelo filme O Paciente Inglês (vencedor de 9 óscares, do romance homónimo de Michael Ondaatje) e esteve nomeado dois anos depois pelo filme O Talentoso Mr. Ripley (1999, nomeado para cinco óscares, do romance de Patricia Highsmith). Realizou ainda Assalto e Intromissão (2006), Um Fantasma do Coração (1990), o seu primeiro filme. Terminou recentemente a produção da adaptação do romance The No. 1 Ladies' Detective Agency, de Alexander McCall Smith. Minghella produziu ainda vários filmes, entre os quais Michael Clayton - uma questão de consciência e O americano tranquilo. Em 2006 produziu a ópera Madame Butterfly, de Puccini, para a Ópera Metropolitana de Nova Iorque, que lhe valeu um prémio Olivier.


Realizador de filmes longos, criador de guiões, muitas vezes a partir de romances, gostava de passar muito tempo num mesmo projecto, daí ter feito poucos filmes. Mas os que fez são obras de arte. Filmes longos que se vêem desejando mais, filmes belos no sentido mais comum.


Escrevo essencialmente sobre Cold Mountain que descobri ao lado da pessoa que amava na altura num dia 14 de Fevereiro. Lembro-me de como uma vez mais Nicole Kidman me seduziu com a sua notável interpretação de mais uma grande mulher, Ada Monroe, de como Renée brilhou no papel de Ruby e a estonteante cena em que arranca a cabeça da galinha e Jude Law se porta muito bem em todas as cenas. E toda a beleza da paisagem, a música a ficar por dentro e o pedido cumprido: «Volta para mim»... Brilhante o modo como o romance foi adaptado (que li logo de seguida), brilhante como foi realizado e montado. É daqueles que me fica para a vida.


Cold Mountain deu o óscar de melhor actriz secundária a Renée Zellweger (o Globo de Ouro e o BAFTA) e a nomeação a Jude Law. Mas tem uma Nicole Kidman impecável, de uma extraordinária força e beleza. Uma banda sonora muito boa de Gabriel Yared (também ela nomeada mais três canções nomeadas para o óscar de canção original) e um argumento adaptado a partir do romance homónimo de Charles Frazier (O Regresso do Soldado, Asa). Muitos especialistas consideram-no um filme perfeito. Apresentação aqui.

sábado, março 15, 2008

novo jogo

Mandaram-me isto por mail (a Sandra, claro). Adorei o jogo... ainda demorei um bocadito,mas menos que os 15 minutos da média. Mas valeu a pena. Partilho.

clicar aqui.

Fado da Procura

Não é bem a mesma coisa, mas a ideia é a mesma. Tenho andado desencontrado de tudo e de todos. Quebrar as rotinas é muito bom, sempre gostei, mas agora às vezes deixa-me extenuado o incerto. Mas também me deixam extenuado os imprevistos que me forçam a voltar à rotina de que vou gostando às vezes. Pronto, nó no cérebro. Não sei se escrevi as coisas como queria. Mas não me apetece procurar outra forma de o fazer.


Primeiro foi a Denise - esperava encontrar-me em Lisboa quando eu ainda estava em Poiares, e eu pensava encontrá-la no Porto aquando da Melopeia de Afectos, mas nessa altura eu teria de estar em Lisboa. Quando ia de Lisboa para o Porto acontecia a Marcha da Indignação dos Professores, e a Denise já não estava na Invicta.


No Porto desencontrei-me da minha função principal: ajudar a Consti a estudar História da Língua II. Outras actividades mais urgentes dela impediram. E fui fazendo companhia nessas actividades comerciais. Ganho sempre quando estou com ela: não me refiro ao Chá Coração da Terra que me ofereceu, ou às bolachas fantásticas, mas sim às trocas intelectuais. E à presença dos gatos, claro (tirei muitas fotos com o telemóvel... nesta dá para ver alguns dos 28 gatos, e também o telefone lá de casa, o gato amarelo - o meu favorito).



Agora a Milai. Era suposto voltar ao Porto, mas a data do exame da Consti mudou, e surgiram outras complicações. Ia ver uma peça a partir do Mia e do Agualusa em Vila do Conde e passar a noite na casa da minha madrinha com alguns amigos dela. Mas é Páscoa, o meu pai faz parte da comissão de festas e enfim... a família faz também, claro. Poderemos estar juntos noutra altura, mas já não será bem igual.

Por fim, desencontrado até no trabalho científico. Não ando com a dissertação para a frente e baralhei datas de envio de resumos para congressos. Descobri ontem que o prazo para o Congresso Internacional sobre Narrativa e Diáspora Portuguesa (1928-2008) acabava hoje... Lá inventei uma coisa à pressa, ontem à noite e hoje de manhã... chamar-se-á: «Um longo caminho nas cores da alma: representação dos portugueses na obra de Mia Couto»... (já revi as outras datas)...

Ainda mais por fim, lá se foi a vontade de ir a Santiago de Compostela. Nem podia ser de outra maneira... (Imagem: Santiago de Compostela, imagem do claustro da Sé de Braga)

E porque gosto muito e tem tudo a ver, ou quase (como disse no início): Fado da Procura, de Ana Moura. Gosto da letra, da música, da voz... e não só... e tem-me acompanhado todos os dias, muitas vezes...

quinta-feira, março 13, 2008

Avalição de Professores: opinião sincera (e às vezes irónica) de um quase professor que pensa ser melhor fugir

Tenho andado um pouco à margem de toda a contestação (justíssima) dos professores. E de outras coisas também, como do acordo ortográfico. Mas este era necessário e já era tempo de vir e ser aplicado a sério. Provavelmente discordarei de uma outra coisa, outras muitas nos parecerão estranhas («Não há, no fundo, nenhuma ideia a que não nos habituemos» diz Camus em O Estrangeiro) mas o trabalho de unificação possível e de adequação da ortografia à pronúncia era necessário. E estou tão de acordo que a minha dissertação de mestrado, se me deixarem, será já feita com a nova ortografia. E a Texto Editores tem já material pronto para comercializar a partir de amanhã.

Quanto ao primeiro assunto, apesar da minha pouca atenção ao mundo exterior nos últimos tempos, só se estivesse morto não teria ouvido falar. Eu estava em Lisboa quando foi a manifestação, mas vim-me embora quando começou - tinha de ir para o Porto. Muitos debates na televisão, na rádio (que não vi na íntegra porque me irritam algumas atitudes que só poderei apelidar de "teimosas"). Todos os dias nas notícias se fala do assunto. E faz capas de jornais. Um problema sério, a sério. E há na blogosfera (obrigatório passar por Felizes Juntos, que possui textos interessantíssimos sobre o assunto, bem como links e uma caixa do google com selecção de alguns importantes posts pelo país fora, mas também o Rabiscos e Garatujas, com exemplos do dia-a-dia de uma professora que sabe reflectir sobre a sua profissão ou situação) um debate muito interessante, com testemunhos de professores, de alunos e pais, de toda a gente que de uma forma ou outra estão implicados no processo. Eu estudei para ser professor mas não quero (só do Ensino Superior), já disse algumas vezes. Não é só por causa disto, mas por tudo. Mas compreendo quem trabalha no sector e gosta(va) de o fazer. (va) porque agora o professor não ensina, o professor preenche papéis, é avaliado por colegas tão ou menos competentes que ele (quando por milagre são da mesma área já não é mau), e tem de passar os alunos porque sim, porque se não cai-lhe toda uma imensa burocracia por cima e uma avaliação mais fraca (Devia ter ido correr atrás dos seus alunos se eles não queriam ir à sua aula; Mas está parvo ou quê, caro colega? O aluno já sabe o Presente, os Pretéritos e o Fututo, não precisa de mais para passar para o 10.º ano!), o professor que vai avaliar dispõe de todo o tempo do mundo para preencher devidamente as burocracias - já trabalha há tanto tempo que não precisa de preparar aulas, diz a ministra (sinistra) da educação (avaliação) - é claro, estes professores ou não querem saber das aulas para nada ou então vão andar a matar-se ainda mais, se quiserem ser competentes e rigorosos em todas as actividades que têm de desenvolver. E não haverá vinganças, ajustes de contas, nada disso. E umas três aulas são suficientes para a avaliar um processo inteiro, claro - correu mal hoje, que pena! Professor, seu mandrião, trabalha umas horitas por dia e ainda se queixa! Olhe que eu sou funcionário público, trabalho das nove às seis e não me queixo (ou queixo, mas pouco, afinal ainda posso estar todo o dia sentado em frente a um computador ou a atender gente que só aturo durante cinco minutos), agora você só tem de estar umas horas na escola: esteve seis horas de pé, quase sempre a falar ou a ouvir atentamente o que os seus alunos dizem, ainda esteve a corrigir trabalhos, planificar aulas para o dia seguinte, foi chamado para uma aula de substituição, teve uma reunião, tentou organizar exercícios de recuperação na escola mas não conseguiu porque não tinha onde trabalhar porque na sala dos professores estava muita gente a conversar e na biblioteca não tinha espaço? Temos pena, a sério. É que em muitas das outras profissões o trabalho fica no trabalho, nesta vem para casa. Corrigir trabalhos e testes, desenvolver esquemas mentais enquanto se cozinha, antes de dormir preparar tudo, a ver se está lá: objectivos, material/recursos, actividades, encadeamento lógico dos assuntos da aula... E tentar arranjar forma de lidar com o filho da &#%* que arranja sempre maneira de desiquilibrar a aula. Avaliação sim, acho bem, muito bem (tal como os exames que inventaram agora, mas isso são outros assuntos). Porque há muitos energúmenos por aí (alguns infelizmente já passaram a titulares). Mas no meio do ano parece-me muito inoportuno, e em moldes de empresa de produção parece-me ridículo: não estamos a fazer camisas cujo produto final pode ser avaliado em termos de quantidade e de qualidade: fizemos quinhentas, só duas têm defeito, sabendo que o sucesso só depende da matéria usada e do nosso trabalho. Não, aqui estão envolvidos professores, pais, organização escolar e, mais importante, alunos - que não são matérias absorventes nem matérias totalmente domináveis. Deveriam, mas não são.

Deixo só, em tons de brincadeira e para aligeirar, a sugestão de leitura de uma das novas obras incluídas no Plano Nacional de Leitura (recebi por email com esta inclusão, mas é do blog we have kaos in the garden, referente ao dia do livro... e acho que vale a pena ).

«Apresentamos aqui, em primeira edição, a obra-prima de Maria de Lurdes Rodrigues, Mona Vazia, ou Como lixei a escola pública. Aplaudido pela critica mais liberal, esta obra mostra como em apenas dois anos se pode abrir o caminho à futura gestão privada das escolas e como se transformam os educa-dores dos nossos filhos, os professores, em inimigos públicos da sociedade e culpados do estado em que se encontra a educação em Portugal».

Tenho de acrescentar isto. É que me dá vontade de bater a quem escreveu isto e a quem pensa assim. Pela leitura do post e do blog percebe-se que o autor não deve ter tido grandes professores. Pelo menos de Português: acentos, regências verbais, pontuação, mas este excerto ultrapassa-me: «não cumplem a Ministra.Cumpem-se a VOCES !!!» - sem comentários, ou antes, talvez comente noutro post este magnífico post em termos de correcção linguística.

Eu sei que isto está grande (bolas, às vezes quando começo é difícil parar) mas deixo um excerto de A Peste, de Camus:

«Está certo. Mas não se felicita um professor por ensinar que dois e dois são quatro. Felicitar-se-á talvez por ter escolhido essa bela profissão. Digamos, pois, que era louvável que Tarrou e outros tivessem escolhido demonstrar que dois e dois faziam quatro, e não o contrário, mas digamos também que esta boa vontade lhes era comum com a do professor, com a de todos aqueles que têm a mesma coragem que o professor e que, para honra do homem, são mais numerosos do que se julga, ou tal é, pelo menos, a convicção do narrador. Aliás, esta compreende muito bem a objecção que podem fazer-lhe, ou seja, que estes homens arriscavam a vida. Mas chega sempre uma hora na história em que aquele homem que ousa dizer que dois e dois são quatro é punido com a morte. O professor sabe-o bem. E a questão não é saber qual é a recompensa ou o castigo que espera este raciocínio. A questão é saber se dois e dois são ou não são quatro. Quanto àqueles dos nossos concidadãos que então arriscavam a vida, tinham de decidir se estavam ou não na peste e se era ou não necessário lutar contra ela.» (ed. Diário de Notícias, colecção Prémio Nobel, p.96-7).

Espero que se lute contra a peste como o no livro se luta, como se pode, com a dignidade que nos define.

quarta-feira, março 12, 2008

Dois poemas de Manuel da Fonseca

Sete Canções da Vida

Quarta
Depois que nossos pés andaram toda a terra,
cruzaram caminhos, devassaram florestas, escalaram montanhas
e volveram sangrentos riscando as estradas do mundo;
depois que o mar é um murmúrio azul de águas fáceis
e se foi o mistério que havia nas distâncias,
evaporado como espuma na quilha dos navios;
depois que nossas mãos mergulharam na noite milenária,
tocaram luas mortas, revolveram estrelas
e enfim! acenaram escorrendo luz de sóis:
- por que não vamos colher os frutos que nós semeámos?
porque não vamos, irmãos, porque não vamos?!

**************

Adormecer

Vai vida na madrugada fria.

O teu amante fica,
na posse deste momento que foi teu,
amorfo e sem limites como um anjo;
a cabeça cheia de estrelas...
Fica abraçado a esta poeira que o teu pé levantou.
Fica inútil e hirto como um deus,
desfalecendo na raiva de não poder seguir-te!


Poemas Completos, Portugália Editora, p.11, 147

terça-feira, março 04, 2008

dois poemas de José Jorge Letria (com pôr-do-sol em Poiares, Set. 2007)

Outras tantas vezes morrerei no que não disse.
Esta palavra morte teima em não me sair
da boca. É antiga e grave como
um pressentimento ou uma cicatriz.
Olho-me nos retratos da distância
e tenho um nome feito de algas.
Toda a minha vida é um círculo inquieto:
os filhos no meio a brincarem com a areia,
a erguerem cidades no vento, e eu de pé,
atordoado pelo medo, a interrogar-me
sobre o amanhã das falas que me tiram
de enganos e temores. Desenho uma planície
branca ou uma casa indefesa e tudo
o que sei é um motim de sombras
à ilharga dos olhos na véspera de outras águas.





Havia as fogueiras e a dança das raparigas
e o verão era um círculo luminoso
no centro do qual o canto todo se movia
como um pássaro ou um fruto
e que ninguém se atrevesse a dizer-me
que não podia ser aquilo a felicidade
com os seus outros nomes e rostos,
com as suas corolas incendiadas
e os seus aromas quentes fugidios.
A infância enchia as casas
com a tinta fresca dos risos e dos jogos
e era como se pintasse as paredes
como o azul limpo da festa irrepetível.
E eu acocorado num canto a contar as horas
que faltavam para setembro ser outono
e para a noite, a dos perturbantes achados,
manchar o soalho com a tinta morna dos temores.


Os Achados da Noite, Prémio Cidade de Ourense 1990, p.85, 89.

segunda-feira, março 03, 2008

Maria Gabriela Llansol 1931-2008

aqui manifestei a minha relação amor-ódio com a escrita da Maria Gabriela Llansol. Por um lado a sombra da M.Ry. a dizer bem da escritora, mas felizmente não nos obrigou a lê-la.... por outro a minha leitura agónica de um beijo dado mais tarde só porque sim, queria experimentar, depois a tese de doutoramento do Pedro Eiras em que ela também foi estudada... a ainda, mais recentemente, no mês passado, a leitura de Onde Vais, Drama-Poesia?... e uma tentativa de escrever um conto à maneira dela...


Escrita densa, difícil, muito para além dos seus ________________ e espaços em branco e quebras como se fosse poesia (e não será?), mas ainda pelas lógicas próprias que não as das narrativas e esperadas, que quebra as fronteiras entre prosa e poesia, ficção, diário, romance e novela e até texto dramático. O leitor tem assim de trabalhar, e muito, para não se perder no fulgor, nas personagens, nas vozes que surgem de todos os lados. Originalidade e luta, para quem gosta.

Para saber mais, o blog dedicado a ela.


Obra:


Os Pregos na Erva (1962), Depois de os Pregos na Erva (1973), O Livro das Comunidades (1977), A Restante Vida (1983), Causa Amante (1984), Na Casa de Julho e Agosto (1984), Um Falcão no Punho (1985), Contos do Mal Errante (1985), Finita (1987), Da Sebe ao Ser (1988), Um Beijo Dado Mais Tarde (1990), Amar Um Cão (1990), Hölder, de Hölderlin (1993), Lisboaleipzig I. O Encontro Inesperado do Diverso (1994), Lisboaleipzig II. O Ensaio de Música (1994), Inquérito às Quatro Confidências (1997), Ardente Texto Joshua (1998), Onde Vais, Drama-Poesia? (2000), Amigo e amiga: curso de silêncio de 2004, (2006).



Como sempre, a palavra ao autor:

«produzi, de ouvido, este texto, para não perecer a chorar; não consigo dominar a sensibilidade nostálgica das separações, e esta é uma das separações da linguagem, e da música;

e assim partimos do sítio onde devíamos ficar para o sítio de onde devíamos regressar;

as ondulações que ouço lá fora são a reconstituição do vento que sopra sobre a terra;»

um beijo dado mais tarde, Edições Rolim, p.80


«embalava-me essa mestra da escrita
dizendo-me como era simples ____________ pega nos fios
que vês no mar,
pega em todas as vozes de animais que ouvires,
segue o fulgor que traça círculos velozes na praia

e escreve

[...]

E vou vendo o que o texto quer dizer, alterando a ordem cronológica das folhas, por vezes, escritas com muitos anos de diferença, relacionando e desrelacionando extractos e fragmentos, tentando perceber os seus diversos tons de voz porque o texto não tem um maneira única de se dizer,

está todo escrito, mas precisa ser montado.»

Onde Vais, Drama-Poesia?, Relógio D'Água, p.214, 266