segunda-feira, março 31, 2008

Sugestões de Março


Nem sempre muito actualizadas, é certo. Mas o tempo é aquela coisa escorregadia que me escapa entre os dedos, sobretudo quando o deixo fugir porque me empreguiço. E para quem tem mais facilidades de livrarias, cabo, aluguer de filmes e assim as susgestões podem parecer muito atrasadas... Aceitam-se também outras sugestões.


Livros:

1 – A Bíblia (Jeremias, Lamentações, Baruc), Paulus

argumentos: Em Jeremias vi sobretudo o profeta em que não se acredita e sofre nas mãos dos incrédulos, e se tem vontade que as suas palavras ditadas por Deus aconteçam o mais rápido possível (já que não há duvida de que acontecerão). Lamentações é um conjunto de cantos fúnebres sobre a destruição de Jerusalém e vale por alguns versos como: «Vós todos que passais pelo caminho, olhai e vede:/ haverá dor semelhante à minha dor?» Lm 1, 12-13. Baruc, em prosa e verso, dá-nos uma ideia do sentimento de exílio dos israelitas espalhados pelo mundo. Insistência na visão horrível das pessoas que chegam «ao ponto de comer a carne de seus próprios filhos e filhas» Br 2, 3.***


2 – Palomar, Italo Calvino, Planeta DeAgostini

argumentos: o nome Italo Calvino deveria chegar, mas está bem: é um livro pequeno feito de pensamentos, observações, experiências de um peculiar Palomar que nos vai dando conta do seu modo de ver e estar no mundo, através da descrição, narração e meditação. Reflexões muito interessantes sobre o silêncio que usarei na minha dissertação. E ainda: «estar morto, significa habituar-se à desilusão de se sentir igual a si próprio, num estado definitivo que já não pode esperar modificar.»p.127****


3 – Os Achados da Noite, José Jorge Letria, Prémio Cidade de Ourense

argumentos: poesia precisa-se mas eu não sei recomendar livros de poesia… Muito menos quando são individuais (e não antologias ou a compilação da obra completa…). Por isso ficam aqui só alguns versos de que gostei: «A minha idade é a de todos os medos»p.15; «Não ouso sair/ de onde estou e estou tão só que não suporto/ o eco grave de uma voz sobreposta à minha voz»p.93***


4 – Poemas Completos, Manuel da Fonseca, Portugália

argumentos: obra que documenta, poesia com personagens, o Alentejo, insatisfação, ansiedade, vida, raiva contra o mundo… expressões que só fazem sentido lendo a sua poesia. «vinham as naus no silêncio das coisas mortas./ Os homens tinham esquecido as palavras de navegar»p.19; «Ao menos se alguém morresse/ e esse alguém fosse um de nós/ e esse um de nós fosse eu…»p.103; « - em que dia nos vamos suicidar?»p.138.***


5 – O Estrangeiro, Albert Camus, Público/Mil Folhas

argumentos: finalmente chegou a vez de Camus. E comecei logo por um que adorei. Fiquei conquistado por Mersault e sua maneira de estar no mundo e se relacionar com os outros, indiferente, indolente, apático. E a sensação de revolta pela incompreensão deste ser demonstrada em tribunal, onde tudo é deturpado, ou não fizesse ele parte do ciclo temático do absurdo. Excelente texto para se estudar as relações Literatura-Direito. «Eis aqui a imagem deste processo: tudo é verdade e nada é verdade»p.73.*****


6 – A Peste, Albert Camus, Diário de Notícias

argumentos: e continua a leitura de Camus. E mais um grande livro, desta vez do ciclo temático da rebelião. Uma cidade assomada pela epidemia da peste e as reacções das diversas personagens à situação de perigo, isolamento e distância dos entes queridos, em que a condição humana é posta à prova. Lido como uma alegoria em relação à ocupação alemã, pode ser lido muito para além disso. Mais: «sem memória e sem esperança, instalavam-se no presente. A peste, é preciso dizê-lo, tirara a todos o poder do amor, e até o da amizade. Porque o amor exige um pouco do futuro e, para nós, já não havia senão instantes.»p.132; «Nada no mundo vale que nos afastemos daquilo que amamos. E, contudo, também eu me afasto, sem que possa saber porquê.»p.152; «há nos homens mais coisas a admirar que coisas a desprezar.»p.222.*****


7 – A Queda, Albert Camus, Livros do Brasil

argumentos: deste não gostei tanto, mas ainda assim é muito bom. Pertence ao ciclo temático da medida (estes ciclos foi o próprio autor que assim os designou). Um discurso de um homem do Direito para um interlocutor também ele desse mundo. Muitas reflexões sobre a vida e sua condição. Mais: «nós não estamos senão mais ou menos em todas as coisas»p.11; «muita gente trepa agora à cruz somente para que a vejam de mais longe, mesmo se para isso for preciso espezinhar um pouco aquele que lá se encontra há tanto tempo»p.134.****


8 – Pensamentos, Marco Aurélio, Livros RTP

argumentos: uma colecção de pensamentos, alguns em estilo aforístico, a partir dos melhores exemplos gregos próximos de uma filosofia estoicista ou da sua experiência de homem dobrado ao íntimo, em torno da morte, da brevidade da vida, da fugacidade dos prazeres e da fama, da mudança. Mais: a morte «não é somente uma obra da natureza, é uma obra útil à natureza»p.22 e «Tens uma excelente maneira de te defenderes deles: evita ser-lhes semelhante.»p.64.***


9 – O Outro Que Era Eu, Ruben A., Assírio & Alvim

argumentos: pronto, outro livro e outro escritor que me fica para recuperar um dia. A extraordinária história de um homem que é dois – não mentalmente – mas sim fisicamente, desdobrado, em que um faz tudo o que o outro não consegue fazer: «indivíduo sai de si continuando a ser ele próprio, e se forma em outro que é ele próprio»p.71. E as reacções do país que não consegue perceber (país nacionalista que se pode ver no tempo da ditadura) o alcance da sua natureza. Mais: «ainda existiam escondidas, pessoas capazes de dizer que não. A tragédia é que se desconhecia onde habitavam.»p.47 e «Eu devia matar-me por acidente!»p.79.*****


TV:

Anatomia de Grey

argumentos: uma das minhas séries favoritas já há algum tempo. Por tudo, pelas histórias (se bem que o caso amoroso Meredith e McBrasa podia resolver-se sem tanto enredo…). Começou na RTP1, dava fim-de-semana sim, fim-de-semana não ou mais ou menos. E eu achava estúpida, porque não gostava de séries de hospitais (excepção para o Dr House, de que já gostei mais…). Depois passou para a noite, às tantas, dois episódios seguidos – e eu vi tudo… tipo tolinho. Repetiram na Dois: e eu voltei a ver quase tudo. E agora aproxima-se do fim e espera-se a nova série com novos desenvolvimentos. Sim, eu não tenho cabo ou coisas do género mas vou sabendo umas coisas pela net... Só espero que não desapareça como O Amor no Alasca.
Mas há outras recomendáveis: Dexter é estranha, um pouco chata por causa dos pensamentos infinitos que preenchem a cabeça do protagonista e dos ritmos latinos à Miami que se vão ouvindo, mas tem cenas interessantes. Irmãos e Irmãs é também de se lhe tirar o chapéu, mas já vai muito adiantada e não se perceberão alguns dos antecedentes que influenciam a história de agora se não se viu do início… Mas vale a pena, e com grande elenco. A Dois: continua a ser a melhor alternativa da tv portuguesa. E as Noites da Dois: brindaram-nos esta semana com duas mini-séries extraordinárias: A Linha da Beleza (do romance homónimo de Alan Hollinghurst, de Saul Dibb, com Dan Stevens, Alex Wyndham , Oliver Coleman, Hayley Atwell, Don Gilet), e Elizabeth I ( de Tom Hooper, com Helen Mirren e Jeremy Irons). Recomendo – estejam atentos que elas voltam qualquer dia (acho que até já deram antes, eu é que na altura tinha vida…).


Música:

Ana Moura – Para Além da Saudade

argumentos: conhecia esta grande fadista de uns fados escolhidos para estarem na colecção de fado do Público: Porque Teimas Nesta Dor e Nasci Para Ser Ignorante. E já tinha ouvido também O que foi que aconteceu, algures no pc (agora resgatada). Depois ouvi-a numa novela da TVI com O Fado da Procura – e ficou na cabeça e adoro-o. Daí a ter o último cd ainda demorou, mas já o tenho e ouço-o muito, agora. Os Búzios, Águas do Sul, O Fado da Procura, Rosa Cor de Rosa, Mapa do Coração, Aguarda-te ao chegar, Até ao fim do fim, Fado das Horas Incertas, Vaga no Azul Amplo Solta (há mais vídeos no youtube de outras músicas) são os meus fados favoritos de um conjunto de quinze grandes canções… Voz quente, grave mas bonita. E com muito bom gosto.

Palavra ainda sobre o Festival da Canção. Parece-me que a escolhida tem algum potencial, a Vânia é potente. A minha canção favorita não ganhou; Magicantasticamente!, dos BláBláBlá, aqui.


Cinema:

O Labirinto do Fauno

argumentos: de Guilherme del Toro com Adriana Gil, Ivana Baquero e Sergi López. Um filme de 2006 que ganhou três Óscares: direcção artística, fotografia e caracterização – quem o viu ou ver percebe porquê. História de uma menina com uma mãe grávida e doente e de uma figura paternal comandante de uma das facções da guerra civil espanhola que encontra um mundo alternativo e do qual é a princesa. Para poder voltar à sua origem tem de cumprir três perigosas tarefas (e numa delas encolhemo-nos todos porque sabemos que a criatura sem olhos e quase mumificada que preside ao festim vai acordar e persegui-la… E pronto, mais não conto, porque vale a pena a ver. E tem um labirinto também.****


Os Irmãos Grimm

argumentos: de Terry Gilliam, com Matt Damon, Heath Ledger, Mónica Belluci, Jonathan Prye e Lena Headey. Uma história alternativa da vida dos dois irmãos alemães que vivem a vida a encenar fenómenos paranormais até ao momento em que descobrem um verdadeiro e tem de lidar com o cepticismo de um e a crença do outro (baseado no seu livro de histórias – que vão surgindo em determinados elementos e objectos). É giro para ver com amigos, sobretudo se perceberem alguma coisa das histórias…***

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